A arte do conhecimento humano pela aprendizagem ao longo da via, inclusive em tempos de pandemia

Cristiane Dall’ Agnol da Silva Benvenutti

 

E agora, José?
A festa acabou, a luz apagou,
o povo sumiu, a noite esfriou,
e agora, José? e agora, você?
você que é sem nome, que zomba dos outros,
você que faz versos, que ama, protesta?
e agora, José?

(Carlos Drummond de Andrade,1942)

A leitura do poema “José” de Carlos Drummond de Andrade, originalmente publicado em 1942, coletânea Poesias, além de retratar o sentimento de solidão e abandono de uma pessoa que reside na cidade grande, expressa ausência de esperança, sensação de solidão e sentido na vida e uma incerteza de definir que caminho tomar.

A essência do poema ao ser remetido ao contexto de aprendizagem ao longo da vida permite uma reflexão que se coloca em diferentes espaços do dia-a-dia.

O conceito de “aprendizagem ao longo da vida” está associado com as formas como aprendemos durante a nossa trajetória. Ao darmos os nossos primeiros passos, balbuciarmos as nossas primeiras palavras, desenvolvermos a arte de comunicar e expressar sobre a leitura de mundo, conseguimos estabelecer novas experiências e relações, adquirir novos conhecimentos. Quando nada interrompe as conexões cognitivas em nosso cérebro, o modo como aprendemos se torna tão essencial, quanto o fato de respirarmos.

O aprender, certamente perpassa a escola, a universidade, mas, podemos destacar que nas instituições, espaços de formação e de aprendizagem formal, o que aprendemos de essencial e relevante está diretamente relacionado às inúmeras experiências que são construídas por nós durante as atividades informais e não formais. Essas atividades que experimentamos advêm de inúmeras situações vividas e que nos exigem o uso de linguagens: oral, sonora, corporal. Em meio a tudo isso, nossas emoções e nossos sentimentos são testados quase que todos os dias, mas é na “escola” que isso se apresenta de forma mais efetiva.

Por outro lado, como fica o que aprendemos na “escola da vida”?

Hoje, compreendemos que o processo de aprendizagem ao longo da vida, abarca processos que acontecem durante as conversas com os amigos, quando assistimos à televisão, lemos um livro, navegamos na Internet, do mesmo modo quando refletimos e/ou imaginamos novos projetos para dias futuros. Porém, é preciso entender que no poema “José” de Carlos Drummond de Andrade numa perspectiva de educação ao longo da vida, está presente a pessoa de tenra idade com sua bagagem histórica repleta de experiências que em alguns momentos foram positivas, e em outros nem tanto assim, mas elas estão vivas esperando alguém lhe dizer: – E, agora José? O que você tem aí na sua longa trajetória de vida que possa me ajudar a resolver esta situação?

Atualmente é preciso dimensionar os contextos de uma educação ao longo da vida, ampliar nosso olhar para como as pessoas adultas e idosas são constituídas, muitas vezes de maneira formal ou informal, e estão em constante aprendizado no longo curso da vida.

Nesse sentido, podemos destacar o Memorandum, um importante documento ratificado em março de 2000 em Lisboa, pela Comissão Europeia que define a partir da política de educação e formação, a aprendizagem ao longo da vida (lifelong learning) como sendo “princípio diretor que garante a todos o acesso às ofertas de educação e de formação que envolve diferentes contextos da aprendizagem”. E, complementa que países da Europa se tornaram polos de conhecimento e economia em virtude do acesso às informações e aos conhecimentos mais recentes, despertaram para motivação de saberes que desencadearam resoluções inteligentes de forma pessoal e coletiva. Muitas pessoas de tenra idade, hoje planejam suas vidas, procuram contribuir ativa e positivamente na sociedade que inclui diversidade cultural, étnica e linguística. Observaram que é a educação, a chave para um novo aprender com o objetivo de superar desafios.

Por outro lado, para descortinar o conhecimento é preciso estabelecer um “conceito novo” de educação ao longo da vida, este que se coloque para a sociedade de forma reveladora como um fenômeno societário, uma nova ordem educativa.

Contudo, é preciso não caracterizar a educação ao longo da vida sob os aspectos de “instrumentalização” e “emancipação”, pois o aprendizado de uma pessoa que supera as fases do ciclo de vida está voltado para as novas oportunidades de crescimento pessoal, desenvolvimento social, familiar, e principalmente, sentir-se útil e obter estímulo e autonomia. Desta forma, oportunizar espaços para atividades de uma educação ao longo da vida, desperta o aprender, os sentidos, sentimentos, significados, necessidades, interesses e as expectativas nas pessoas de terceira idade.

O aprender é uma das capacidades e marcas essenciais dos seres humanos, ele acontece em qualquer fase de sua vida e se expressa de formas diferentes, um outro desafio que envolve conhecer-se e conhecer ao outro em meio ao universo de culturas que estão nos formando.

Autora: Cristiane Dall’ Agnol da Silva Benvenutti é mestre em Educação, professora do Curso de Licenciatura em Pedagogia do Centro Universitário Internacional Uninter.

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