ARTE E FEMINILIDADE – O poder da arte como forma de expressão e autoconhecimento

FOLHA DA MULHER SJP – ED 159 – AGOSTO 2025 – Katia Velo

Recentemente, um caso brutal de tentativa de feminicídio me tocou profundamente: uma mulher foi violentamente agredida com mais de sessenta socos no rosto por seu “namorado”. Inimaginável! Uma violência absurda e inadmissível. Não podemos nos calar: como mulheres, mães, filhas, amigas. Em pleno 2025, ainda enfrentamos essa realidade cruel e devastadora.

Como colunista cultural, não posso me isentar. A arte é uma forma de expressão, e nós somos reflexos do nosso tempo. Falar sobre arte é, inevitavelmente, falar sobre a vida, sobre dores, afetos e a complexidade das relações humanas.

Na história, infelizmente, há inúmeros relatos de abusos contra mulheres, inclusive no universo artístico. Já escrevi sobre isso na edição 126 da nossa querida Folha da Mulher. Nesta edição, volto meu olhar com um novo foco para três figuras marcantes da arte: Camille Claudel, Frida Kahlo e Dora Maar. Trajetórias femininas que nos ajudam a refletir sobre dominação, sofrimento, resistência.

Camille Claudel (França, 1864–1943): talento sufocado, amor desmedido

Escultora brilhante e sensível, Camille Claudel tornou-se, aos 19 anos, assistente e colaboradora de Auguste Rodin. Apesar de sua enorme contribuição, foi por muito tempo rotulada apenas como “a amante de Rodin”; um rótulo cruel que apagou sua identidade artística.

Rodin, mesmo prometendo casamento e um futuro ao lado dela, permaneceu com Rose Beuret, sua companheira de longa data. Camille enfrentou rejeição amorosa, desvalorização profissional e a opressão de um meio majoritariamente masculino. Após o rompimento, mergulhou em sofrimento psíquico. Diagnosticada com esquizofrenia, destruiu obras, desenvolveu paranoias e acusou Rodin de perseguição. Internada por sua própria família, passou os últimos 30 anos de vida em um hospital psiquiátrico, esquecida e invisibilizada.

Frida Kahlo (México, 1907–1954): a dor que virou cor

Frida Kahlo é um símbolo de força, dor e autenticidade. Após um grave acidente na juventude, que a deixou com sequelas permanentes, encontrou na pintura um modo visceral de expressar seu universo interior. Abordava com coragem temas como dor, maternidade, identidade, política e feminilidade.

Seu relacionamento com Diego Rivera foi intenso e conturbado, marcado por paixão, infidelidades e conflitos. Ainda assim, Frida nunca deixou de afirmar sua identidade como mulher, artista e pensadora. Sua obra é nitidamente a expressão de seus sentimentos e emoções.

Dora Maar (França, 1907–1997): à sombra do gênio

Dora Maar, fotógrafa e artista surrealista, teve sua trajetória profundamente marcada pelo relacionamento com Pablo Picasso (Espanha, 1881–1973). Sua imagem foi eternizada em obras como A Mulher que Chora, mas a intensidade da relação oscilava entre inspiração e sofrimento. Dora entrou em colapso emocional após o término e viveu anos reclusa.

Françoise Gilot, outra companheira de Picasso, rompeu com ele e escreveu A Vida com Picasso, revelando o temperamento controlador do artista. Picasso chegou a afirmar:

“Para mim, só existem dois tipos de mulheres: deusas ou capachos.”

Essa frase, tão perturbadora quanto reveladora, escancara como até mesmo a genialidade pode ser usada como escudo para justificar opressão.

Autoconhecimento: o caminho da liberdade

Essas histórias não pertencem apenas ao passado. Elas nos alertam sobre o presente. Nos convidam a olhar para dentro, reconhecer nossos limites, valorizar nossas emoções e apoiar umas às outras.

Não precisamos de capas nem de máscaras. Não precisamos ser perfeitas, maravilhosas ou heroínas. Precisamos ser reais. Cultivar o amor-próprio, aceitar nossas imperfeições e celebrar quem somos; essa é a verdadeira força.

Que cada mulher se permita florescer no seu tempo, do seu jeito. E que, juntas, sejamos campo fértil para o florescimento umas das outras.

Sem capa, sem máscara, com alma: ser mulher é arte. E florescer é um ato de coragem.

Katia Velo – 13 anos assina a Coluna KV na Folha da Mulher
Artista visual, colunista cultural e assessora de comunicação.

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